Prefeitura de SP rescinde contrato com consórcio que construía túnel da Sena Madureira e determina restauração da via


Ofício do secretário-executivo de Mobilidade e Trânsito do município informa que decisão foi embasada em pareceres das assessorias técnica e assessoria jurídica da prefeitura. Rescisão foi recomendada pelo MP-SP e ocorre após protestos de moradores. Rua Sena Madureira
TV Globo
A Prefeitura de São Paulo rescindiu, nesta quinta-feira (13), o contrato com o Consórcio Expresso Sena Madureira, que tratava da construção de um túnel entre a Avenida Sena Madureira, na Vila Mariana, com a Ricardo Jafet, no Ipiranga, ambas na Zona Sul da capital.
De acordo com o ofício do secretário-executivo de Mobilidade e Trânsito do município, Gilmar Pereira Miranda, a decisão foi tomada a partir de manifestações da assessoria técnica e da assessoria jurídica.
Além da rescisão unilateral do contrato, o secretário também determinou ao consórcio “que promova as medidas necessárias para a recomposição da Avenida Sena Madureira, com a devolução da via ao estado anterior ao início da obra” e “efetue a desmobilização do canteiro de obras”.
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A obra de R$ 218 milhões foi alvo de vários protestos dos moradores da região e também de várias ações no Ministério Público de São Paulo (confira o histórico abaixo). A área teve árvores retiradas e, agora, a empresa precisa fazer uma compensação ambiental.
A decisão é parte da decisão da prefeitura de acatar uma recomendação do MP e reiniciar o processo para a obra. Em fevereiro, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) havia anunciado que fará uma nova licitação para a construção da ligação entre as vias.
Segundo o prefeito, o promotor Silvio Marques emitiu uma recomendação para que o processo comece do zero, e a gestão municipal decidiu seguir a sugestão.
“O dr. Silvio Marques sugeriu e vou seguir a sugestão dele. Vamos perder um pouco de tempo, mas melhor é já começar a nova rota para recuperar”, disse o prefeito à TV Globo.
No documento, Marques alertou a gestão municipal sobre a necessidade de rescisão do atual contrato, sob alerta de o próprio prefeito ser alvo de uma ação civil pública por improbidade administrativa.
Silvio Marques afirma que o atual contrato firmado com a construtora Álya Construtora S.A., antiga construtora Queiroz Galvão S.A., “claramente decorre de fraude da qual a empresa participou e que envolve outras licitações do Programa de Desenvolvimento do Sistema Viário Estratégico Metropolitano de São Paulo, sob a responsabilidade da DERSA – Desenvolvimento Rodoviário S.A.”, antiga empresa do governo de São Paulo.
O prefeito Ricardo Nunes e o promotor Silvio Marques
Montagem/g1/Divulgação/Alesp/GESP
Na recomendação, o promotor pedia que o prefeito e o secretário de Transportes, Celso Jorge Caldeira, providenciassem, em até dez dias, a rescisão da atual concorrência do túnel “considerando os crimes, fraudes e superfaturamento de preços durante o processo licitatório originário”.
Ele ressaltou que o assessor jurídico da própria gestão municipal admitiu à Promotoria de Justiça, durante a instrução do inquérito civil, que “errou ao não verificar as fraudes e crimes contra a Administração Pública nas licitações do Programa de Desenvolvimento do Sistema Viário Estratégico Metropolitano de São Paulo”.
“Houve superfaturamento de preços nas diversas licitações de, pelo menos, 10,8%; envolveu o pagamento de propina a Paulo Vieira de Souza, ex-diretor da DERSA. (…) Mas na resposta constante no ofício nº 407/SMT.GAB/2024, subscrito pelo Secretário-executivo Gilmar Pereira Miranda, claramente insiste na manutenção da obra em apreço, cuja licitação (concorrência 017/10/SIURB) foi criminosamente fraudada por representantes de várias empresas, a partir de 2008”, completou.
Em nova decisão, Justiça mantém suspensão de obra do túnel na Sena Madureira
O inquérito civil público que originou a recomendação do promotor Silvio Marques foi aberto depois de representações abertas por vários parlamentares da oposição, como deputado estadual Antonio Donato (PT), a deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL) e o vereador Celso Gianazzi (PSOL).
Eles questionavam o processo de retomada do túnel como as mesmas premissas do contrato assinado inicialmente com a Queiroz Galvão S.A., na época da gestão do prefeito Gilberto Kassab (PSD).
O promotor também se baseou nas decisões judiciais que suspenderam a execução das obras, por problemas ambientais e de mobilidade urbana na região da Rua Sena Madureira, que geraram vários protestos dos moradores da Vila Mariana ano passado.
Histórico de protestos
Protesto contra obra na Rua Sena Madureira, na Vila Mariana, Zona Sul de São Paulo, no último domingo (10).
Arquivo pessoal
A obra do túnel da Sena Madureira foi recomeçada em abril de 2024, sendo alvo de vários protestos e ações na Justiça que resultaram em ao menos três decisões judiciais que determinaram a paralisação da construção.
A principal crítica dos moradores da região é sobre o impacto da obra na mobilidade do entorno do bairro e também as consequências ambientais com o corte de árvores, que já tinha sido iniciado pela construtora Álya, além do respeito às nascentes de rio da região.
Na última decisão judicial, em novembro do ano passado, o desembargador Paulo Ayrosa, da 2ª Câmara Reservada do TJ-SP, afirmou que ”há questionamentos a respeito da existência ou não de nascente natural” no local da obra e, por isso, determinou a paralisação da construção.
Em caso de descumprimento, a multa diária prevista era de R$ 100 mil até R$ 5 milhões.
“O que inviabilizaria, em tese, a continuidade das obras para construção do ‘Complexo Viário Sena Madureira’ pelos réus no mesmo endereço, sem a devida apreciação do tema pelos órgãos ambientais competentes”, disse o desembargador.
Moradores da Vila Mariana protestam contra o corte de árvores na Rua Sena Madureira, em obra da gestão Ricardo Nunes (MDB).
Montagem/g1/Reprodução/Instagram
Em outra decisão de outubro, a Justiça de SP suspendeu a obra e o corte de árvores, após o Ministério Público abrir ação civil pública pedindo a paralisação do túnel.
Na decisão, o juiz Marcelo Sergio, da 2ª Vara da Fazenda Pública, considerou que era preciso interromper imediatamente, antes de perícia, porque os danos são irreversíveis. Em caso de descumprimento, a multa diária prevista é de R$ 50 mil e de R$ 100 mil por árvore cortada.
“Considerando, então, que, até a conclusão da perícia preliminar, a situação fática poderá ser alterada com a continuidade da obra, causando prejuízo ambiental irreversível, defiro a tutela para determinar a paralisação imediata da obra”, disse a decisão.
Estudo ambiental copiado
Estudo ambiental de 2024 copia o de 2009
Outra polêmica envolvendo a construção dos dois túneis da Sena Madureira diz respeito ao estudo de viabilidade ambiental que embasou a decisão da prefeitura de SP de continuar com a construção.
O documento tem trechos idênticos a um estudo feito em 2009 para a via e também a outro estudo para canalização do córrego Itaquera, na Zona Leste.
O g1 e a TV Globo analisaram os documentos de 2024 e de 2009 e encontraram vários trechos idênticos. A página 205 do estudo feito este ano, por exemplo, é uma cópia da página 208 do estudo de 2009.
A imagem usada para mostrar a vegetação localizada no acesso ao túnel, em 2009, é a mesma do documento atual. Além disso, as listas de árvores que precisam ser cortadas também são iguais, até mesmo a altura e o diâmetro de cada árvore é idêntico, apesar de terem se passado 15 anos.
Estudo ambiental para obra de túnel na rua Sena Madureira em 2024 tem trechos copiados de análise feita há 15 anos
TV Globo
Outro trecho do atual estudo não existia no documento de 2009. Mas é idêntico a um parágrafo inteiro do estudo de viabilidade ambiental das obras de canalização do córrego Itaquera, na Zona Leste da capital, que não tem qualquer relação com mudança proposta para a rua Sena Madureira e fica a mais de 20 quilômetros do local.
Estudo ambiental para obra de túnel na rua Sena Madureira em 2024 tem trechos copiados de análise feita há 15 anos
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