Setor de saúde apoia reforma tributária, mas busca IVA ‘apropriado’

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A reforma tributária que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) promete aprovar ainda neste ano é positiva, mas é necessário que ela seja apropriada de acordo com as características dos principais atores envolvidos, segundo a avaliação de entidades que representam o setor da saúde no Brasil.

As associações, que representam de fabricantes de insumos a planos de saúde, dizem apoiar a reforma, mas afirmam que a saúde necessita de uma alíquota diferenciada do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que deverá ser de 25% para a maioria dos setores.

“O que temos apontado é que fundamentalmente o setor de saúde tem que ter na reforma tributária, na PEC, o reconhecimento da essencialidade do setor. O setor tem uma carga tributária alta no Brasil, diferente de outros países do mundo”, argumenta Fernando Silveira Filho, presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia para Saúde (Abimed).

Segundo Filho, a associação já realiza encontros com congressistas para explicar as necessidades do setor. Para ele, a complexidade do setor de fabricantes de insumos da saúde é tão grande que as alíquotas variam bastante a depender do item. Por isso, uma alíquota do IVA abaixo de 10% seria ideal para o setor, diz ele.

“Intuitivamente, trabalhamos que as alíquotas deveriam estar abaixo de 10% para o setor de saúde. Gostaríamos que, ao final de todas as discussões legislativas, tivéssemos uma convergência que levasse a acumular menos crédito tributário possível. Como vai se creditar de tudo, você passará para frente também a carga que você agregou e isso gera um peso ao longo da cadeia”, afirma.

Ainda segundo Filho, apesar da busca por IVA abaixo dos 10%, o apoio à reforma tributária ocorre como forma de pressão pela simplificação do atual sistema. “O sistema tributário atual é complexo, afinal são 27 legislações estaduais além dos impostos federais e municipal, como o ISS. Isso gera, além dos custos inerentes à gestão tributária nas empresas, sobrecarga ao cidadão dada à regressividade embutida no sistema. No setor de dispositivos e equipamentos médicos, temos, no mínimo, mais de 110 arranjos tributários, o que significa alíquotas variando de 2,6% até 68%”, explica.

As propostas discutidas atualmente preveem um IVA não cumulativo. Portanto, cada comprador de materiais e serviços receberia os créditos dos impostos pagos pelos fornecedores, a fim de evitar dupla tributação.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa 13 grupos de operadoras de planos e seguros privados de assistência à saúde e planos, está ao lado da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) propondo um regime específico do IVA “mais adequado às atividades do setor para evitar aumento da carga tributária e inviabilização de alguns produtos”.

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Já para a Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos Médicos (Abimo), o setor necessita obter um princípio de essencialidade dado os cuidados necessários com a saúde humana.

“Nós defendemos que uma reforma tributária, ainda que incompleta, é melhor do que nenhuma. Pode ser que ela não aconteça da maneira que queremos, mas tenho esperança de que algo de positivo pode surgir. Se esperarmos pela reforma ideal, nunca acontecerá”, afirma Paulo Henrique Fraccaro, CEO da Abimo.

Para ele, o maior problema do sistema atual é a isonomia tributária. “Essa isonomia, por exemplo, faz com que órgãos públicos e as Santas Casas possam importar o produto que quiserem, mesmo tendo fabricante nacional, sem pagar nenhum tributo, como imposto de importação, PIS/Cofins, IPI e ICMS”, explica. “Entretanto, se esse mesmo órgão público quiser comprar produto semelhante no Brasil, pagará todos os tributos, dando um valor entre 35% e 43%. Por isso, os hospitais que têm estrutura para importação preferem importar”, acrescenta.

Segundo ele, a Abimo defende alíquota zero do IVA para compras públicas, para que qualquer possibilidade de aumento na tributação não seja repassado ao público, além de seguir o que já é praticado em alguns países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

“Existe uma recomendação da OCDE de reduzir a carga fiscal sobre a saúde para haver universalização do atendimento e do uso de dispositivos médicos”, diz.

Países contam com alíquota diferente

De acordo com Pedro Humberto Bruno de Carvalho Junior, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a pandemia da covid-19 acelerou a implementação de uma alíquota especial introduzida em alguns países da OCDE.

“Em alguns países há uma alíquota especial, principalmente durante e após a pandemia. O setor de suprimentos médicos costuma ser o mais beneficiado”, afirma.

Na Alemanha, por exemplo, cobra-se 7% de IVA sobre serviços médicos e odontológicos. Enquanto que na Itália e na Espanha, a alíquota é de 4% e zero para alguns produtos médicos.

Quando mais exceções, mais IVA

À CNN Brasil, o secretário extraordinário de reforma tributária, Bernard Appy, admitiu que será necessário tratamento diferenciado para alguns setores econômicos para que a proposta seja aprovada no Congresso Nacional.

“O que eu tenho colocado no Congresso é: quanto mais exceções tiver, maior vai ter que ser a alíquota básica, para poder manter a arrecadação com proporção do PIB. A decisão sobre quais vão ser os tratamentos diferenciados é do Congresso. Nossa função é explicar os prós e os contras e o custo de diferentes alternativas”, disse Appy à publicação.

Para Gilberto Pereira, auditor da Associação dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Anfip), a legislação da reforma deveria ser única, simplificando as alíquotas, mesmo que sejam diferentes para alguns setores.

“A reforma é positiva pois não é possível continuar como está sem uma forma de estar sistematizado. Uma empresa de um estado que queira vender para outro precisa entender qual alíquota terá. Tem que haver a reforma, uma legislação única e um aparelhamento tecnológico que simplifique as alíquotas”, argumenta.

Já para o advogado Marcelo Bertoncini, mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento Especialista em Direito Tributário, a criação de exceções para dado setor, em tese, não simplifica o sistema como se pretende.

“O setor de saúde é fundamental para o país, portanto, a tributação pela qual contribui deve estar em conformidade com a sua manutenção e prosperidade, mesmo que como exceção na sistemática das alíquotas. Entretanto, a dificuldade reside em abrir as exceções. Afinal, outros setores também têm papel relevante no desenvolvimento socioeconômico do país. Por quê não haver exceções para o setor educacional também, por exemplo? E a ‘descomplicação’ do sistema, como reagiria às exceções?”, questiona.

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