A expansão de PPPs de iluminação pública e a inclusão das cidades inteligentes

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Cada vez mais, a delegação dos serviços de iluminação pública tem ganhado destaque, em especial por meio dos projetos de Parcerias-Público Privadas (PPPs), posto que a contratação da iniciativa privada vem se mostrando muito mais vantajosa e benéfica tanto para o parceiro público quanto para o parceiro privado.

As PPPs do setor de iluminação pública usam, como garantia e pagamento, um recurso orçamentário considerado sólido, previsto na Constituição Federal, e que tem, por finalidade específica, custear os serviços de iluminação pública: a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (COSIP ou CIP).

Por muito tempo, houve diversos questionamentos acerca da constitucionalidade e da legalidade da cobrança desse tributo. Tais dúvidas, porém, foram pacificadas no Judiciário em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que julgou o Recurso Extraordinário 573.675-0/SC[1], interposto pelo Ministério Público Estadual, contra a Lei Complementar 7/2002, do município de São José (SC).

Com o tempo, passou-se a ser indagado o alcance da COSIP/CIP: poderia ser adotada para custear o melhoramento e a expansão da rede municipal de IP ou somente se aplicaria para fins de manutenção e operação da rede?

Frente a isso, o ministro do STF Marco Aurélio proferiu decisão e reconheceu a repercussão geral do tema debatido no RE 666.404/SP[2], relativamente à constitucionalidade da cobrança visando satisfazer despesas com melhoramento e expansão da rede de iluminação pública, ao entender que “diante da complexidade e da dinâmica características do serviço de iluminação pública, é legítimo que a contribuição destinada ao seu custeio inclua também as despesas relativas à expansão da rede, a fim de atender as novas demandas oriundas do crescimento urbano, bem como o seu melhoramento, para ajustar-se às necessidades da população local”.

Apesar da pacificação do uso do tributo também para o melhoramento e a expansão da rede, a rápida evolução tecnológica tem requerido mais avanços, sendo a iluminação pública, sob o aspecto técnico, uma das alternativas mais promissoras para implantação de avanços como as smart cities, as cidades inteligentes, “cidade criativa e sustentável, que faz uso da tecnologia em seu processo de planejamento com a participação dos cidadãos”.[3]

No entanto, atualmente, os serviços associados ao conceito de cidades inteligentes não estão incluídos na classe de iluminação pública, considerando-se o previsto no artigo 189, da Resolução Aneel 1.000/2021, que determina que não se inclui, nesta classe, o fornecimento de energia elétrica que tenha por objetivo, entre outros, “a realização de atividades que visem a interesses econômicos”; e “o atendimento a semáforos, radares e câmeras de monitoramento de trânsito”.

Em recente estudo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (ABDIB) sobre as propostas para incorporar serviços de cidades inteligentes em contratos de PPPs de iluminação pública[4], foram analisadas as características e demais possibilidades relativas às cidades inteligentes nesses projetos, a fim de melhor aprofundar sua compreensão, especialmente em virtude do crescimento e desenvolvimento do setor.

Ainda que a rede de IP possa ser considerada porta de entrada para a implantação de novas tecnologias, a regulamentação da Aneel acaba, de certo modo, dificultando tais avanços. Além disso, a COSIP/CIP tem, como finalidade específica, o custeio e a expansão da rede de iluminação pública, não podendo ser utilizada para finalidades diversas. Isto é, poderá ser usada para custear serviços relacionados à prestação do serviço, mas não poderá custear serviços que, embora usem a infraestrutura da rede de iluminação pública, não estejam relacionados à prestação do serviço em si.

Assim, a adoção de sistemas de cidades inteligentes poderia ser realizada por meios alternativos à PPP, sem se constituir em parte do escopo do projeto. Como alternativa à implantação de sistemas de cidades inteligentes, há alguns caminhos a serem explorados.

O primeiro seria a utilização da própria infraestrutura não como parte do escopo da PPP, mas como uma atividade relacionada que, por meio do uso da infraestrutura, explorará receitas acessórias, prevista, especialmente, nos artigos 11 e 18, da Lei Federal 8.987/1995. Essas atividades consistem na exploração econômica da rede municipal, realizada em paralelo e sem prejuízo à prestação dos serviços, conforme regras expressamente previstas em contrato.

Outra opção seria a desvinculação de receitas, prevista no artigo 76-B, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A medida surgiu para dar maior flexibilidade à execução orçamentária, visto que 30% das receitas arrecadadas dos municípios, incluindo a COSIP/CIP, poderiam ser desvinculadas de sua finalidade para serem usadas em outra atividade desde que legalmente autorizada e observada a vigência constitucional.

Ainda que haja a restrição de utilização do tributo para serviços diversos, há uma constante busca de um caminho para a flexibilização das PPPs do setor, de modo que possa ser aproveitada a rede para implantação de ações de cidades inteligentes.

Na prática, o que se vê é um movimento para facilitar a exploração de receitas acessórias, por meio de atividades relacionadas, nos contratos de PPPs, enquanto ainda não existe um entendimento pacificado sobre a viabilidade das cidades inteligentes.

Projetos de PPPs de iluminação pública recentemente publicados já preveem atividades relacionadas previamente autorizadas pelo parceiro público com o objetivo de se aferirem receitas acessórias.

Os estruturados pela Caixa – Ponta Grossa (PR), Olinda (PE) e Ribeirão Preto (SP) – preveem a autorização para as atividades de: (i) aluguel, locação ou cessão de espaço na rede municipal de iluminação pública; (ii) exploração de serviços que se utilizem da infraestrutura do sistema de telegestão; (iii) a instalação de câmeras de videomonitoramento ou de pontos de internet sem fio (WiFi) pela concessionária; e (iv) exploração de atividades que visam gerar receitas atreladas a créditos de carbono.

Já os do BNDES – Canoas (RS) e Caxias do Sul (RS) – preveem a autorização para as atividades relacionadas que tenham, exclusivamente, terceiros como clientes, e utilizem a rede municipal de IP para: (i) prestação de serviços de telecomunicações, inclusive a transmissão de dados; (ii) prestação de serviços de videomonitoramento; (iii) aluguel de espaço no braço ou luminária para instalação de antenas, câmeras e sensores; e (iv) prestação de serviços de medição e monitoramento que necessitem da implantação de sensores.

Há, ainda, outros projetos novos de iluminação pública, como o de Curitiba (PR), em que o parceiro privado já celebrou contrato para atividades relacionadas à telegestão das luminárias inteligentes distribuídas pela cidade com a empresa de telecomunicações TIM[5].

Portanto, ainda que haja a restrição legal para uso dos recursos da COSIP/CIP para custeio de serviços da cidade inteligente, os contratos de PPP estão permitindo que o parceiro privado, com sua criatividade e empreendedorismo, possa viabilizar tais projetos, que, se bem sucedidos, vão gerar investimentos, retorno e compartilhamento de ganhos com o setor público.


[1] Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=593814. Acesso em 09 de janeiro de 2023.

[2] Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15344298650&ext=.pdf. Acesso em 09 de janeiro de 2023.

[3] Disponível em: https://fgvprojetos.fgv.br/noticias/o-que-e-uma-cidade-inteligente. Acesso em 09 de janeiro de 2023.

[4] Disponível em: https://www.abdib.org.br/wp-content/uploads/2021/10/Estudo-Cidades-inteligentes-em-PPPs-IP.pdf, pág.8. Acesso em 09 de janeiro de 2023.

[5] Disponível em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/04/23/engie-e-tim-fecham-parceria-para-gesto-da-iluminao-pblica-em-curitiba.ghtml.

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