‘Os rostos de Itajaí’: histórias de quem veio pra ficar e peixeiros apaixonados pela cidade

O município de Itajaí, no Litoral Norte catarinense, foi colonizado por portugueses no século 18 e alemães no século 19, sempre tendo uma forte ligação com a navegação e a pesca.

Hoje, o município abriga um dos maiores complexos portuários do país e, por conta disso, é exponte na recepção de turistas e pessoas de todo o país que chegam para ficar.

Cidade é escolhida por pessoas de diferentes estados, e querida pelos itajaienses – Foto: Reprodução/ND

Além das belezas naturais e cultura única, os “estrangeiros” vêm a Itajaí procurando oportunidades de emprego, um lugar calmo, bom para viver e onde se sintam em casa.

De acordo com dados do Censo Demográfico de 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), das 183 mil pessoas que residiam na cidade na época, quase 84 mil não tinham nascido no município.

Em celebração ao aniversário de 163 anos de Itajaí, o ND+ buscou entender um pouco mais sobre o perfil daqueles que buscaram ter família, memórias e experiências inesquecíveis na cidade. Veja, a seguir, os relatos dos itajaienses que agora fazem parte da história da cidade.

Luciane da Silva d’Avila

Amante do mar e da diversidade cultural de Itajaí, um dos rostos que marca a personalidade local é o de Luciane da Silva d’Avila, de 54 anos. Natural de Porto Alegre (RS), ela chegou a Santa Catarina há 20 anos, inicialmente morando em Balneário Camboriú e depois em Blumenau.

Como dava aulas na Univali (Universidade do Vale do Itajaí), a gaúcha já gostava e conhecia Itajaí, para onde se mudou há cinco anos. “Tenho uma relação de carinho por essa cidade, que sempre me foi super acolhedora”, ela relata.

Luciane gosta de ir ao Mercado Público de Itajaí com amigos e familiares – Foto: Reprodução/ND

Luciane conta que sempre foi louca pelo mar e colecionou diversas amizades e memórias nas praias itajaienses. Esse foi um dos principais motivos que a levou a viver aqui, onde atua como funcionária pública da saúde.

Com um sentimento de pertencimento, ela reforça que se sente em casa e que ama a diversidade cultural de Itajaí, a qual forma a personalidade local. Os lugares preferidos dela são o Mercado Público e a praia do Canto do Morcego.

Contudo, a gaúcha diz que a cidade precisa de investimentos sérios na saúde e na mobilidade urbana, bem como na visibilidade e acessibilidade de minorias que estão à margem da sociedade. “Precisamos discutir a cidade que queremos de forma mais democrática, mais inclusiva e mais plural”, afirma.

Em comparação com Porto Alegre, onde nasceu, Luciane destaca a qualidade da segurança no litoral catarinense, já que vem de uma capital muito violenta.

Cláudio Lima Reis

Movido pela paixão e pela vontade de encontrar um lugar melhor para viver, Cláudio Lima Reis, de 53 anos, trouxe um pouco da cultura carioca para Itajaí. Convidado por um reencontro do passado com quem hoje é casado, Darlan, ele chegou a Itajaí há cerca de 11 anos e amou o local.

Mesmo tendo atuado no setor de logística no Rio de Janeiro por diversos anos, os ares da cidade nova lhe inspiraram a seguir um hobby e iniciar o próprio salão de beleza, no qual atua há uma década.

A mudança para Itajaí inicialmente o fez se sentir deslocado, principalmente por conta de preconceitos que sofreu na pele no começo.

Darlan já morava na cidade, e convidou Cláudio para se mudar para SC – Foto: Reprodução/ND

“Eu quase desisti de viver aqui naquela época”, afirma o cabeleireiro. Hoje, ele ama a segurança e a paz da cidade, assim como as amizades e influências que o fazem permanecer em Itajaí.

Ele ressaltou a forma como o SUS (Sistema Único de Saúde) funciona na cidade, “de vento em polpa”, e agradeceu por sempre ser bem atendido quando precisa.

“Itajaí é como se fosse uma cidade do interior do Rio de Janeiro, onde tudo acontece bem depois que nas capitais, se é que você me entende”, destaca.

Além disso, ele comentou que sente falta de eventos culturais, que aqui não acontecem com tanta frequência ou não são divulgados. O Centro da cidade é o local prefiro do cabeleireiro.

Maria Gorete de Souza (Magô)

Com amor pelo “peixeirês”, praias, turismo, cultura açoriana, música e vida noturna, Maria Gorete de Souza, mais conhecida como Magô, de 68 anos, tem orgulho de morar em Itajaí. A cidade a faz lembrar muito onde nasceu, a capital Florianópolis.

Natural de Florianópolis, as semelhanças com Itajaí a fizeram morar na cidade – Foto: Reprodução/ND

Morar em uma cidade que segue em desenvolvimento, “crescendo a olhos vistos em todas as instâncias”, é algo espetacular para ela, que não deixa de mencionar pontos a serem melhorados.

A cantora gosta de frequentar teatros e cinemas e tem preferência pela música ao vivo, e acredita que Itajaí deveria ter mais locais destinados à arte popular.

Magô é cantora e se apresenta nos espaços artísticos do município – Foto: Reprodução/ND

Um grande diferencial de Itajaí em comparação com Florianópolis, na visão dela, é a presença de um porto, o qual contribui muito para o desenvolvimento local e regional.

José Bento Rosa da Silva

“Eu não escolhi ficar aqui, eu fui escolhido para ficar aqui”. A frase em destaque é de José Bento Rosa da Silva, de 64 anos, natural de Lavras (MG). Hoje, ele cultiva uma relação de afeto e gratidão com Itajaí, onde mora desde fevereiro de 1982.

O professor desembarcou na cidade 41 anos atrás, por conta de uma oportunidade de emprego que encontrou.

Professor comanda canal no YouTube chamado Africanidades Conectadas – Foto: Reprodução/ND

Aqui, o professor Bento conheceu a esposa e teve filhos, nascidos em Itajaí. Ele afirma que gosta muito das amizades que fez, assim como de pedalar pelas ruas antigas da cidade, que lhe fazem lembrar dos bons tempos.

Graduado em História, é professor com especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado na área, e já atuou em colégios públicos e privados, tais como Henrique da Silva Fontes, Victor Meirelles, Salesiano, São José, Unificado e Univali.

Assim, ele afirma que no passado, quando veio para Itajaí, o local era muito mais acolhedor com o público de fora, os migrantes. “Nos últimos anos, por razões que desconheço, me parece mais intolerante com essas pessoas”, comenta.

Manoel José Pereira

E a paixão por Itajaí contagia até quem já não vive mais na cidade. Natural de Itajaí, Manoel José Pereira, de 72 anos, nasceu em 26 de março de 1951.

Ele lembra muito bem que veio ao mundo na rua Juvenal Garcia e foi criado na Jorge Matos, no Centro, próximo à Univali.

Assim, passou sua infância brincando no Morro da Cruz e indo às praias de Cabeçudas, Atalaia, Geremias e da Fazenda, onde hoje é a Beira-Rio.

Inclusive, ele deixa claro que Cabeçudas é a melhor praia do mundo e que foi muito feliz quando, por quatro anos, pode morar próximo ao farol da praia.

Os avós, pais e tios de Manoel trabalharam em portos, enquanto as irmãs se tornaram professoras. Ele, diferentemente do restante da família, seguiu carreira na Marinha do Brasil.

Aos 18 anos de idade passou em um concurso, ficou cerca de um ano e meio na Escola de Aprendizes Marinheiros em Florianópolis e depois foi para o Rio de Janeiro, onde seguiu carreira por 30 anos.

Mesmo a quilômetros de distância, o coração do marinheiro nunca saiu de Itajaí. Isso por conta de que que todos os seus familiares moravam aqui e por ter as “raízes firmadas” em solo peixeiro.

Manoel com a filha Pâmela Fonseca – Foto: Reprodução/ND

Sempre que podia, passava as férias na cidade, inclusive trazendo seus filhos consigo, os quais também adoram o local e vivem aqui até hoje.

Em 1991, Manoel Pereira conseguiu transferência para a Capitania dos Portos de Itajaí, onde serviu por mais 4 anos, já no fim da carreira. Nessa época, se envolveu com a política e permanece envolvido com movimentos sociais locais.

Foi coordenador de uma comissão da Sociedade Sebastião Lucas, de recuperação da cultura afrodescendente, e participou da realização da 2ª Virada Afro-Cultural de Itajaí.

Agora, ele mora em Florianópolis com a esposa e frequentemente visita os filhos e netos em Itajaí, principalmente no verão para passear pela “melhor praia do mundo”, Cabeçudas.

“Continuo peixeiro até meu último suspiro. Quero ser cremado e ter minhas cinzas jogadas nas águas de Cabeçudas”.

Violeta Alves

Cantora, escritora e mulher com deficiência, Violeta Alves, de 32 anos,  nasceu em Itajaí e nunca quis a deixar.

Filha de pais paulistas que escolheram a cidade como lar, foi no litoral catarinense que ela criou memórias, enfrentou desafios e iniciou a carreira artística.

“Em alguns momentos da nossa vida, a gente até pensou ‘vamos pra outros lugares, vamos para uma capital’, e pelo fato de eu ser uma mulher com deficiência e a gente sempre pensa, né? Mas nós muitas vezes íamos pra outros lugares, fazíamos o que eu tinha que fazer dentro do meu tratamento, e voltavamos para Itajaí”, relembra.

Contudo, os pais de Violeta sempre acharam a cidade acolhedora, segura e de muitas oportunidades. Assim como ela, que nunca quis deixar o local onde nasceu.

Por ser uma mulher com deficiência, a família de Violeta chegou a cogitar mudança para outro estado – Foto: Reprodução/ND

A artista relembra que durante o início do tratamento da osteogenese imperfeita, conhecida como “ossos de vidro”, a família até cogitou se mudar para outro estado, já que não era possível realizar o tratamento em Santa Catarina.

Mas essa opção não era o que Violeta queria. “Eu lembro que eu sempre dizia, ‘aqui é tão bom, tudo é tão perto’. Porque eu moro no bairro são João, que é o bairro coração da cidade. E eu ficava pensando ‘eu não quero ir embora daqui’”, lembra.

Violeta destaca as iniciativas municipais para a atuação da classe artística, através das quais gravou músicas, videoclipes e lançou um livro. Entre leis de incentivo a cultura, editais e ações, a cantora e escritora se sente acolhida pela comunidade artística da cidade, além de pela própria Fundação Cultural.

O sentimento dela em relação a cidade é de pertencimento e carinho. Violeta destaca a Casa da Cultura Dide Brandão como um dos seus lugares preferidos, por conta também da grande acessibilidade promovida.

Além disso, o Teatro Municipal tem um espaço em seu coração, com o contato com a cultura, música e artistas a poucos minutos de casa.

Violeta se apresentou no Festival de Música de Itajaí de 2022, na praça da Casa da Cultura Dide Brandão – Foto: Reprodução/ND

Na verdade, ela descreve a sensação de sentir parte da cidade, com memórias felizes e outras nem tanto, mas histórias pessoas que se interlaçam com o do próprio município.

“Itajaí estampa nela também a minha história. Então é muito bonito eu passar pela cidade e saber que tem um pouco de mim em cada lugar que eu vou”, finaliza.

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