Febre amarela em Ribeirão Preto: entenda o que é a doença e por que macacos não podem ser responsabilizados pela transmissão


Doença não é contagiosa e é transmitida por, pelo menos, três tipos de mosquito. População em um raio de 300 metros onde vírus foi detectado está sendo vacinada. Macacos mortos em Ribeirão Preto, SP, estavam contaminados com o vírus da febre amarela
Reprodução/EPTV
Na segunda-feira (6), o Instituto Adolfo Lutz confirmou que os macacos encontrados mortos em uma área de mata no campus da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto (SP) estavam infectados pelo vírus da febre amarela.
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Três dias antes, na sexta-feira (3), a Secretaria Municipal de Saúde já tinha traçado um plano de ação e passou a vacinar as pessoas que moram em até um raio de 300 metros da universidade, que fica na região Oeste.
Isso porque, antes mesmo do laudo que atestou a causa das mortes como sendo febre amarela, o Laboratório de Virologia da USP já tinha feito análise das vísceras dos animais e chegado à conclusão que eles estavam infectados. Só que, ainda assim, era necessária a comprovação do Adolfo Lutz.
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Apesar da confirmação, especialistas ouvidos pela reportagem destacam que não há motivo para pânico.
Macacos encontrados mortos em Ribeirão Preto, SP, são da espécie bugio
Reprodução/EPTV
Não só a área onde os corpos dos animais foram encontrados está isolada, como também Ribeirão Preto deve receber 100 mil doses de vacina ainda nesta semana.
Nesta reportagem, você vai entender o que é a doença, como ela é transmitida, quem precisa se vacinar e por que os macacos não devem ser considerados vilões. Veja abaixo:
O que é a febre amarela?
Macacos transmitem a doença?
Quem deve ser vacinado?
Quem já foi vacinado, precisa de dose de reforço?
Como se prevenir da doença?
O que é a febre amarela?
A febre amarela é uma doença não contagiosa transmitida por, pelo menos, três tipos de mosquito:
Na área silvestre, Haemagogus e Sabethes são os dois transmissores da doença e eles têm os primatas como principais hospedeiros, ou seja, infectam os macacos por meio da picada.
Febre amarela é transmitida no Brasil principalmente por mosquitos silvestres dos gêneros Haemagogus e Sabethes
Josué Damacena/IOC/Fiocruz
Na área urbana, o mosquito transmissor é o Aedes aegypti, o mesmo que também causa doenças como dengue, zika e chikungunya. A febre amarela também é transmitida pela picada do inseto com o vírus.
Aedes aegypti
Reprodução
No Brasil, os últimos casos de febre amarela na área urbana foram registrados em 1942. Ocorrências confirmadas a partir desta data são decorrentes do ciclo silvestre de transmissão, ou seja, causadas pelos mosquitos Haemagogus e Sabethes.
De acordo com o Ministério da Saúde, ela é uma doença infecciosa febril aguda, de evolução rápida e gravidade variável, mas que pode ser evitada por meio da vacina.
A doença é bem parecida com a dengue e provoca dor de cabeça, febre, dor no corpo e dor atrás do olhos, mas é muito mais letal, segundo o infectologista da USP, Fernando Belíssimo Rodrigues.
“A febre amarela não requer uma hidratação abundante como a dengue. Por outro lado, não existe um tratamento específico, não tem um antiviral que se possa usar e a febre amarela é muito mais grave do que a dengue. A letalidade na dengue é inferior a 0,1%. Na febre amarela, é da ordem de um terço, de 30% [dos casos]”.
Nas formas graves da doença, ainda existe uma manifestação clínica chamada de icterícia, que a pele e os olhos ficam amarelados, diz Belíssimo.
“É porque a doença pode afetar o fígado e aí então acontece esse amarelamento. Mas nem todos os casos de febre amarela a pessoa fica amarela, só nos casos mais graves”.
Toda vez que surgem casos suspeitos de febre amarela, é preciso avisar as autoridades competentes em um prazo de 24 horas, para que medidas de urgência sejam tomadas para evitar o contágio.
Macacos transmitem a doença?
Não. Macacos não transmitem a doença e esta informação está completamente errada. Assim como os humanos, estes animais são hospedeiros da febre amarela, que é causada pela picada de mosquitos.
Macacos da espécie bugio, encontrados mortos na USP Ribeirão, foram infectados com o vírus da febre amarela
Reprodução/EPTV
Em 2017, quando Ribeirão Preto teve duas mortes confirmadas por conta da febre amarela, a população passou a agredir e matar macacos encontrados na área urbana mas a verdade é que eles funcionam como uma espécie de ‘controle’, como explica Benedito Lopes da Fonseca, também infectologista da USP.
“Macacos nos auxiliam no sentido de que nós detectamos a circulação do vírus em uma determinada região e nós vamos a essa região e nós fazemos ações para conter a passagem do vírus para o homem. É para dificultar a passagem da febre amarela no ciclo selvagem para o ciclo onde o homem está exposto. O que nós não queremos é que o ser humano seja infectado pelo vírus da febre amarela”.
Secretário de Saúde de Ribeirão Preto, Maurício Godinho ressalta que os macacos servem como sentinelas, ou seja, são vigias que acabam por prevenir ‘invasões’.
“Nós não devemos fazer controle aos macacos, não devemos fazer nenhuma ação contra o macaco. O macaco [morto na USP] simplesmente nos ajudou e serviu como sentinela para identificar que a doença estava existindo.”
Qualquer primata pode contrair a doença, mas os bugios são mais suscetíveis por serem mais lentos que as demais espécies, ainda segundo Belíssimo.
“O bugio é especialmente suscetível, porque é um macaco lento, isso facilita o mosquito a sentar nele e picar. Os saguis, como são muito inquietos, são um alvo menos importante, mas também podem adoecer e morrer de febre amarela”.
Quem deve ser vacinado?
Qualquer pessoa a partir de nove meses deve se vacinar contra a febre amarela. Em Ribeirão Preto, pessoas que moram em um raio de 300 metros da USP e ainda não se vacinaram, devem procurar os postos de saúde.
“A vacinação, com certeza, é a forma mais efetiva. Essa vacina é, possivelmente, a mais efetiva que existe entre todas as vacinas [de outras doenças]. A OMS fez uma avaliação alguns anos atrás de 600 milhões de doses aplicadas, foram documentados apenas 12 falhas vacinais. A efetividade da vacina, praticamente, é 100%”, aponta Belíssimo.
Vacina contra febre amarela
Rodrigo Nunes/MS
Apesar de eficaz e indicada para toda a população, algumas pessoas devem evitar a imunização, por se tratar de uma dose com vírus atenuado (que está vivo).
Segundo o Ministério da Saúde, não podem ser vacinadas:
Crianças menores de 9 meses de idade
Mulheres amamentando crianças menores de 6 meses de idade
Pessoas com alergia grave ao ovo
Pessoas que vivem com HIV e que tem contagem de células CD4 menor que 350
Pessoas em de tratamento com quimioterapia/ radioterapia
Pessoas portadoras de doenças autoimunes
Pessoas submetidas a tratamento com imunossupressores (que diminuem a defesa do corpo)
Belíssimo diz que, nestes casos, é necessário que a pessoa converse com o médico.
“É uma avaliação de risco benefício. O que a gente fala para essas pessoas é procurar o seu médico ou procurar um posto de saúde e dizer sua condição e aí a gente analisa caso a caso. Se o risco for muito alto de febre amarela, às vezes, a gente acaba até vacinando nessas condições. Mas, geralmente, se evita”.
Quem já foi vacinado, precisa de dose de reforço?
Desde 2017, por determinação do Ministério da Saúde, não é mais necessário tomar uma segunda dose da vacina contra a febre amarela estando em território brasileiro. A medida está de acordo com as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Por isso mesmo, a pessoa não precisa correr para o posto de saúde se já foi imunizada uma vez na vida.
“Ela tem de correr pra ver a carteira de vacinação e não pro posto de saúde. Se a pessoa está vacinada, não tem muito o que fazer”, diz Belíssimo.
Segundo ele, estudos feitos no ano 2000 com soldados que combateram na Guerra do Vietnã e receberam esta mesma vacina 30 anos antes, continuavam com anticorpos circulando.
Ainda assim, de acordo com a Secretaria de Estado da Saúde (SES), toda pessoa que reside em áreas com recomendação da vacina contra febre amarela e pessoas que irão viajar para estas áreas devem imunizar-se pelo menos dez dias antes do deslocamento. Este é o período para se criar anticorpos.
“Quem for viajar para zonas de mata, acampamentos, trilhas ou cachoeiras deve se imunizar o quanto antes”, diz Regiane de Paula, coordenadora de Controle de Doenças da SES.
Como se prevenir da doença?
A melhor forma de prevenção à febre amarela é, obviamente, a vacina.
Mas a prevenção ainda passa por se evitar os lugares onde há presença confirmada do vírus e também o uso de repelente, para aquelas pessoas que, por algum motivo, não podem ser vacinadas.
“As pessoas que têm contraindicação à vacina podem usar repelente. Os mais eficazes são aqueles à base de icaridina [derivado da pimenta] e dietiltoluamida, o DEET [que interfere nos receptores sensoriais dos mosquitos]. São os dois mais eficazes”, conta Belíssimo.
Apesar de não haver casos de febre amarela na zona urbana desde a década de 40, o infectologista ressalta que uma outra forma de prevenção é o controle do Aedes aegypti na cidade.
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