Derretimento das concessões cariocas não é obra do acaso

As concessões no Rio de Janeiro estão derretendo. Concessionárias de barcas, trens, distribuição de energia, aeroporto colapsaram. Antes já ocorrera com o BRT e o complexo RioMais, criado para a Olimpíada. O Porto Maravilha patina há anos.

Concessão é a delegação a particulares do encargo de explorar uma atividade a cargo do Estado. O poder público transfere uma obrigação (oferecer utilidades e prestações essenciais); o particular a explora como atividade econômica. Pressupõe três elementos: atendimento adequado à coletividade, viabilidade econômica e ambiente institucional confiável. A falta destes elementos leva à sua derrocada.

As desventuras do Rio não são coincidência. Resultam de quatro mazelas. Falhas de concepção, precariedade institucional, indiferença regulatória e oportunismo populista. Não são exclusividade carioca. Mas lá abundaram.

O Porto Maravilha padeceu de excesso de otimismo. Foi concebido com expectativas econômicas infactíveis. No Galeão, o modelo previa volume exagerado de passageiros, sem teto para o ônus de outorga. É inevitável: concessões mal concebidas darão errado.

O ambiente institucional não é menos importante. Inadmissível que um concessionário não consiga cobrar nem metade da utilidade que fornece, como é o caso da Light. Ou que uma concessão de trens se torne inviável pelo furto de trilhos ou por restrições à circulação em regiões controladas pela milícia, caso da Supervia. Que barcas tenham custos inexequíveis pela quantidade de lixo na Guanabara. No caso RioMais o contrato foi desconsiderado. Se o Estado não garante condições de segurança pública ou ambientais mínimas, a delegação é impraticável.

Cabe ao regulador corrigir problemas de modelagem ou imprevistos. Tem que aferir permanentemente as condições de prestação, punir falhas ou neutralizar impactos. Quando o regulador, por incapacidade ou omissão deliberada, não enfrenta a tempo e modo estas circunstâncias, o negócio é impossível. É frequente os reguladores se negarem a enfrentar problemas e renegociar contratos. A Aneel parece alheia à inadimplência e ao furto de energia. A indiferença regulatória aos problemas de modelo ou de instabilidades institucionais é o prelúdio do colapso.

Por fim, o oportunismo populista. Comum os dirigentes usarem a concessão como dupla alavanca. Primeiro, vendem a ideia de que a delegação resolverá todos os problemas. Depois, desconsideram contratos, prazos e direitos para supostamente agradar eleitores. Um prefeito carioca quebrava praças de pedágio a golpes de trator. No BRT o município interveio por alegada falha na prestação; um ano depois, não melhorou a qualidade do serviço. Ao final, ao invés de enfrentar as causas da precariedade, decretou a caducidade da concessão já operada por ele. Cumprir contratos e quitar obrigações de pagamento pode ser impopular. Mas é dever do poder público.

Nada indica que conceder seja sempre possível ou conveniente. O exemplo do Rio, porém, nos ensina que, se for feita, deve ser levada a sério.

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