Após falta de pagamento da Prefeitura de Magé e do Estado, crianças perdem o direito de tratamento com homecare

Uma advogada que acompanha os casos afirma que empresa que presta o serviço está sem receber há mais de um ano e dívida chega a quase R$ 2 milhões. Crianças com problema de saúde estão perdendo direito ao homecare
Mães denunciam que crianças com vários problemas de saúde estão perdendo o direito ao homecare, uma estrutura hospitalar montada em casa, em Magé, na Baixada Fluminense. Uma advogada que acompanha os casos afirma que o Governo do Estado e a Prefeitura devem que R$ 2 milhões à empresa que presta o serviço.
É o caso do pequeno Andrey, de 8 anos, que tem paralisia cerebral e uma doença rara, a Síndrome de West, que causa crises epiléticas frequentes. Há quase 2 anos o quarto dele se transformou numa pequena UTI hospitalar. Ele depende dos equipamentos para sobreviver.
“Ele tem paralisia cerebral, [e] Síndrome de West. Hoje, ele usa traqueostomia para se alimentar, é dependente do respirador. Ele tem uma escoliose severa também, que acaba dificultando essa questão respiratória dele. [Ele] Toma as medicações de convulsão, pressão, coração. Então, é assim. Coisas que a gente não consegue manter sozinhos”, conta Andressa Alves Palma, mãe do menino.
Toda a assistência do menino vem da “Anjos que Cuidam”, empresa privada que atende pacientes de alta complexidade, em casa.
O atendimento inclui acompanhamento com uma equipe multidisciplinar, formada por médicos, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, nutricionistas e fonoaudiólogos.
Tratamento pago pelo Estado
A responsabilidade pelo atendimento é da Prefeitura de Magé e do Governo do Estado. Uma iniciativa importante, para manter pacientes, como o Andrey, longe do ambiente hospitalar e dos riscos de infecções.
No entanto, o trabalho foi interrompido. Na última semana, a empresa informou que o serviço domiciliar será suspenso e os aparelhos retirados, por falta de pagamento. Como ele depende da estrutura para sobreviver, teve que voltar para o Hospital Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias.
“Para mim, foi um baque, porque nenhuma mãe quer que seu filho depois de estabilizado, bem, volte para o hospital. E meu filho está super bem. Meu filho saiu do hospital pesando 12kg. Não saía de 12kg. Saiu com ferimentos horríveis nas costas. É uma nova criança. Meu filho, hoje, pesa 32 kg. A pele dele é íntegra, não tem um ferimento, não tem uma assadura, não tem nada”, diz Andresa.
Outra mãe e o mesmo drama
Outra mãe que teme que o serviço seja paralisado é Lívia dos Santos da Silva. Mãe do pequeno Thalles Bernardo, de 5 anos, que tem Atrofia Muscular Espinhal, o AME, ela teme que o menino volte para o hospital. O que para ela significa regredir no tratamento.
“Eu lutei muito para que ele voltasse para casa após dois anos internado, e depois que eu consegui, depois de três anos, que eu consegui ter ele dentro de casa e receber a notícia de que o meu filho pode voltar pro hospital a qualquer momento por falta de verba vinda do município e do estado para mim foi uma notícia muito cruel”, conta.
De acordo com Flávia Tapajoz, advogada especialista em Direito Médico e da Saúde, e que acompanha as famílias, desde 2022, a justiça vinha determinando o bloqueio de recursos nas contas da prefeitura e do estado, para a continuidade do serviço.
Mas, como não havia dinheiro nas contas do estado, a ordem não foi cumprida. Segundo Flávia, a dívida, por causa dos atrasos no pagamento, a cerca de um ano e meio, já chega a quase R$ 2 milhões.
Agora, de acordo com a advogada, o processo está parado por um impasse judicial.
“Há 5 meses, esse processo está no Tribunal de Justiça aguardando julgamento de um conflito de competência, para saber quem é que vai continuar gerindo o processo: se é a Vara Cível ou a Vara de Família. E aí a gente não sabe quanto tempo isso vai durar”.
O outro lado
A Prefeitura de Magé informou que os valores dos bloqueios nas contas do município foram transferidos ao Poder Judiciário, e que o dinheiro para pagar a empresa é bloqueado das contas tanto do estado quanto da prefeitura e repassado à advogada das crianças.
A Secretaria Estadual de Saúde (SES) informou que os recursos estão disponíveis em conta para as famílias. Mas, que a liberação precisa de uma petição, que não foi apresentada. A SES afirmou, ainda, que a atribuição de fornecer homecare é dos municípios. Mas que está cumprindo a decisão judicial e abriu licitação para contratar uma empresa.
O Tribunal de Justiça do RJ explicou que os processos estão em tramitação e que não houve nenhuma decisão judicial suspendendo o homecare, nem autorização para que a empresa interrompesse o atendimento.
O TJ disse, ainda, que a aplicação da tabela SUS é obrigatória na prestação de serviços de saúde e que, no caso do Andrey, a advogada não protocolou petição sobre a suspensão do serviço. Depois disso, de acordo com o tribunal, o juízo vai analisar o caso. Sobre Talles, o processo está em segredo de justiça.
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