Em busca de inclusão pelo filho surdo, professora aprende Libras no Sul de SC

Mãe de um adolescente surdo, Saionara da Silva da Rosa enfrenta diariamente uma batalha para garantir os direitos do filho. De Criciúma, Davi da Silva Oliveira da Rosa tem 15 anos e foi diagnosticado com surdez quando tinha pouco mais de um ano e meio de vida.

Davi é surdo profundo no ouvido direito e severo no esquerdo – Foto: Montagem/ND                                

Ao descobrir a deficiência de Davi, a professora decidiu iniciar um curso de Libras para se comunicar com o filho, sempre buscando novas formações para aprimorar o idioma. “Eu sou intérprete na minha igreja e estou tentando promover aulas lá dentro”, revela.

A Língua Brasileira de Sinais foi reconhecida oficialmente como um meio de comunicação e expressão no Brasil em 24 de abril de 2002. Desde então, Saionara e muitos outros – surdos ou não – lutam para a inclusão das Libras na rotina dos brasileiros.

Segundo a pedagoga, quando o filho nasceu, a família nem imaginava que ele poderia ser surdo. “O Davi era uma criança muito esperta, mas quando completou um ano ainda não estava falando, então o levei no pediatra e contei que ele não estava desenvolvendo a fala, mas o médico explicou que era comum e que cada criança tinha seu tempo”, explica.

Após a consulta médica, a professora se sentiu mais calma, mas não deixou de analisar o comportamento do filho. Poucos meses depois, Davi ainda não apresentava nenhum sinal de desenvolvimento oral, então outro médico foi procurado.

Atualmente Davi tem 15 anos – Foto: Saionara da Rosa/Arquivo Pessoal/Reprodução/ND

“Quando ele completou um ano e meio, eu fiquei mais inquieta e o levei em um otorrinolaringologista, ele pediu uma audiometria, mas como o Davi era muito novo o resultado foi inconclusivo”, afirma Saionara.

Como a audiometria não forneceu um diagnóstico claro, a criança teve que ir até Florianópolis para realizar o exame Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico, mais conhecido pela sigla em inglês, Bera. “Esse exame diagnosticou ele como surdo profundo no ouvido direito e severo no esquerdo”, comenta a professora.

Apesar de muita luta, Saionara sabe que a realidade dos surdos não é fácil. “Muitas pessoas surdas existem por aí, elas trabalham, estudam, pagam impostos, fazem parte da nossa sociedade mas, infelizmente, estão à margem dela, sempre dependendo de alguém”, fala, com emoção.

Polo de Surdos

Em Criciúma, a Escola de Ensino Básico Polo de Surdos Professora Maria de Lourdes Carneiro, no bairro Rio Maina, atende estudantes, a partir de 4 anos, até o 9° ano do fundamental. Vinte e dois dos estudantes são surdos e todo o processo de integração e desenvolvimento escolar deles é feito de forma bilíngue.

“Primeiro ele [o aluno] aprende os sinais e os significados em Libras, depois a língua portuguesa. Então a gente tem uma professora bilíngue que atende todas as turmas de estudantes surdos”, explica a diretora da escola, Daniela Rosso Miranda Santos.

O papel da intérprete em sala de aula é mais do que a tradução do conteúdo ou da explicação dos exercícios para o aluno surdo. “Além de fazer a interpretação, ela faz a adaptação das atividades, colocando sinais e imagens sempre que necessário”, conta Daniela.

A escola é reconhecida como uma referência na cidade quando se trata de inclusão de pessoas com deficiências auditivas. Toda a sua estrutura é inclusiva. As salas têm o alfabeto em língua portuguesa e em língua de sinais e os ambientes são sinalizados.

“A gente tem um sinal audiovisual, sempre que o sinal toca tem um sinal de led que acende a luzinha também, para o surdo perceber a troca de aula, início de aula e o recreio”, revela a diretora.

Inclusão Social

Saionara e Daniela não são as únicas na busca pela inclusão das Libras na sociedade brasileira. Ana Paula Jeremias da Matta, de 45 anos, nasceu surda e dá aulas de Libras tanto para pessoas surdas quanto ouvintes.

“Nós [surdos] temos uma dificuldade enorme de acessibilidade, é raro encontrar alguém que domine Libras no comércio, é complicado pedir um lanche, um remédio, e até ajuda pra escolher roupas. Quando vamos ao médico, também é desafiador expressar a dor que sentimos por meio de gestos”, desabafa Ana Paula.

As Libras só foram consideradas um meio de comunicação em 2002 – Foto: Freepik/Divulgação/TJSC

De acordo com o IBGE, 5% da população sabem Libras. “Eu acredito muito que as libras precisam sim, fazer parte do currículo, do dia a dia e ser polarizada, ser respeitada e ser reconhecida realmente como segunda língua”, afirma Daniela.

“A linguagem de sinais é extremamente importante para os ouvintes, principalmente pra quem é pai, mãe, irmão, filho ou amigo de um surdo. É uma coisa que deveria ser muito divulgada, feito campanha mesmo para que as pessoas se conscientizassem”, diz Saionara.

Além de promover a inclusão social e facilitar a interação entre pessoas surdas e ouvintes, a Linguagem Brasileira de Sinais traz diversos benefícios a quem não possui nenhuma deficiência auditiva, como o  desenvolvimento de habilidades cognitivas.

Leitura labial

Articular bem cada palavra é uma boa para quem precisa falar com surdos e não sabe Libras, isso se a pessoa portadora de deficiência auditiva em questão, souber fazer leitura labial. No geral, pessoas ouvintes costumam achar que todo surdo entende o que é dito só de olhar para a boca com atenção, mas não é bem assim.

“Muitos surdos não fazem leitura labial, muitos, muitos surdos”, relata a diretora de ensino da Associação de Surdos de Criciúma, Johana Vieira de Medeiros. É como tentar enrolar em outro idioma e querer que um nativo entenda.

Em algumas situações, pode até funcionar, mas não se deve sempre contar com isso. “Ela vai auxiliar na compreensão em alguns casos, não quer dizer que ela vai auxiliar em todos os casos. É muito individual”, explica Johana.

Nem todas as pessoas surdas fazem leitura labial – Foto: Gabriel Valentin/Divulgação/ND

O aprendizado da leitura labial vai além do que vemos articulado na boca. “É treino e persistência! Vai além de simplesmente ler os lábios, as habilidades sensoriais também são exercitadas”, explica a fonoaudióloga especializada em motricidade orofacial, de 47 anos, Patrícia Vincenzi da Silva.

Para o caso de precisar se comunicar com algum surdo, sem saber Libras e usar a leitura labial, há algumas dicas que podem ajudar. “Jamais grite, fale exageradamente ou muito devagar, fale de frente e não dê as costas durante a conversa, faça pausas durante o assunto, em um grupo de pessoas, fale sempre um por vez e sempre pergunte se o surdo conseguiu entender”, orienta Patrícia.

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